Em época de banhos e almoços mais prolongados, o mito da paragem da digestão após as refeições volta a ser tema de conversa.
O cardiologista Dr. Hugo Café explica o que interessa saber.
Durante gerações, muitos ouviram o mesmo aviso, dito com toda a convicção: “Não se pode ir à água logo depois de comer. A digestão pode parar e isso é perigoso.” Este conselho passou de pais para filhos, tornando-se quase uma “lei de praia” — mas, na verdade, trata-se de um mito sem fundamento científico.
Nadar depois de comer é perigoso?
A evidência médica atual, com base em estudos de instituições como a American Red Cross, a Mayo Clinic ou a International Life Saving Federation, confirmam: nadar após uma refeição não representa risco significativo.
É verdade que, após refeições muito pesadas, pode haver desconforto ou cãibras ligeiras — o que é comum em qualquer esforço físico pós-prandial —, mas não há qualquer relação comprovada entre nadar depois de comer e afogamentos ou paragem cardiorrespiratória.
A origem desta crença parece remontar a recomendações antigas, como as que figuravam em manuais de escuteiros do início do século XX, onde se sugeria algum tempo de repouso após comer. Com o tempo, esta precaução evoluiu para uma proibição sem base clínica.
O verdadeiro risco está noutro lado.
Conforme já comentado anteriormente no artigo "Choque térmico nas praias. Um risco real, mas evitável", é essa a situação que merece verdadeira atenção médica.
Entrar bruscamente numa água muito fria após exposição prolongada ao sol pode desencadear uma resposta fisiológica intensa — incluindo alterações respiratórias e circulatórias — que, em certos casos, pode levar a síncope ou paragem cardiorrespiratória, especialmente em pessoas com problemas cardíacos prévios.
As recomendações práticas para prevenir essa situação, já descritas anteriormente no “Choque Térmico” devem continuar a ser seguidas com rigor.
Conclusão: a digestão não “para” por se ir à água. O que realmente pode causar problemas é uma entrada imprudente em água fria, sem preparação e sem atenção ao estado físico.
É tempo de deixarmos os mitos de lado e promovermos informação baseada em ciência. Boas práticas de prevenção salvam vidas — não o relógio de duas horas depois do almoço.
Dr. Hugo de Mendonça Café
Cardiologista HPA
OM: 47617